A inteligência artificial (IA) deixou de ser promessa do futuro e se tornou realidade presente.
Hoje, algoritmos ajudam a diagnosticar doenças, recomendam filmes, automatizam processos e produzem conteúdo em questão de segundos. Tendo isso em vista, empresas e consumidores já convivem com a IA no dia a dia, mesmo sem perceber.
Mas, por trás dessa revolução tecnológica, há uma questão que precisa ser discutida com urgência: qual é o custo ambiental desse avanço?
A expansão da IA gera impactos que estão ficando mais significativos para o meio ambiente a cada dia, principalmente no consumo de energia, na demanda por água e na geração de resíduos eletrônicos. É preciso entender esses efeitos e buscar caminhos para equilibrar inovação e sustentabilidade.
Quem já assistiu à animação Wall-E da Disney, percebe que esse futuro está cada vez mais perto.
Por que a IA consome tanta energia?
O treinamento de modelos de inteligência artificial, como os de aprendizado profundo ou deep learning, exige processamento de grandes volumes de dados e cálculos complexos.
Esses cálculos são realizados em data centers, que são instalações gigantescas, com milhares de servidores que funcionam sem interrupção, 24 horas por dia, 7 dias por semana. Segundo a Folha de S.Paulo (2024), um único centro de processamento consome, em média, a mesma quantidade de energia que uma cidade com 30 mil habitantes.
Ainda que o Brasil tenha uma matriz energética relativamente limpa, com cerca de 50% de fontes renováveis, o setor de tecnologia ainda depende muito das termelétricas, porém, elas emitem gases de efeito estufa e agravam a crise climática.
Além disso, a energia consumida pela IA não se limita ao treinamento inicial dos modelos. Cada vez que uma pessoa interage com um chatbot, solicita uma recomendação ou gera uma imagem com inteligência artificial, há um novo processamento e, portanto, novo gasto energético.
Um estudo da Universidade de Massachusetts Amherst (2019) estimou que o treinamento de um único modelo de linguagem de última geração pode gerar até 284 toneladas de CO₂, o equivalente a cinco vezes a emissão média de um carro durante toda a sua vida útil, para se ter ideia do impacto.
Data centers: o coração (e o pulmão) da tecnologia
De 2012 para cá, o número de data centers no mundo aumentou mais de 16 vezes, segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA, 2024). Isso intensificou a demanda por energia, água, minerais e terras raras, além de ampliar a geração de lixo eletrônico.
No Brasil, a situação preocupa. Os data centers instalados no país podem consumir de 3 a 5 milhões de litros de água por dia, principalmente para resfriar os servidores. Assim como o consumo de energia, isso também equivale ao consumo diário de uma cidade de 30 mil pessoas. Além da quantidade, há o problema da qualidade da água devolvida ao meio ambiente, muitas vezes em temperaturas mais elevadas, o que prejudica a vida aquática e os ecossistemas locais. Essa informação foi publicada pelo portal Desinformante (2024).
A corrida tecnológica e os riscos para a matriz energética
O setor de tecnologia está investindo pesado no Brasil. Empresas como a Microsoft e a AWS já anunciaram investimentos bilionários em expansão de data centers até 2034, com valores estimados em R$ 14,7 bilhões e R$ 10,1 bilhões, respectivamente.
Segundo o Ministério de Minas e Energia (MME, 2024), esse crescimento pode exigir até 9 gigawatts adicionais de energia até 2035, o que pressiona ainda mais o sistema elétrico nacional e impõe desafios para a transição energética.
Lixo eletrônico e exploração de recursos naturais: outro impacto invisível
O avanço da IA também gera impactos indiretos, relacionados à produção e ao descarte de equipamentos. Chips, placas, cabos e servidores consomem grandes quantidades de materiais como terras raras, vidro e metais pesados.
Para se ter uma ideia, a fabricação de um único computador de 2 kg exige aproximadamente 800 kg de matéria-prima, segundo levantamento do portal Desinformante (2024). Ao final da vida útil desses equipamentos, o descarte inadequado de resíduos eletrônicos torna-se uma preocupação adicional, devido ao risco de contaminação do solo e da água.
Quais são as soluções para uma IA mais sustentável?
Apesar dos desafios, existem alternativas viáveis para reduzir o impacto ambiental da inteligência artificial. Algumas delas já estão sendo discutidas e implementadas no Brasil.
O governo federal lançou, em 2025, a Nova Política Nacional de Data Centers, que prioriza o uso de energia renovável, incentiva a infraestrutura segura e estabelece diretrizes para minimizar os impactos socioambientais. Além disso, o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) prevê investir R$ 500 milhões em projetos de IA com responsabilidade ambiental, segundo o portal TI Rio (2025).
Empresas do setor também têm adotado práticas de TI verde, como a reutilização do calor gerado pelos servidores para aquecimento de ambientes, o uso de energia solar e eólica e o reaproveitamento de componentes eletrônicos. A HostDime Brasil, por exemplo, já opera seus data centers com 100% de energia solar, o que mostra que é possível unir tecnologia e sustentabilidade no setor.
Outro ponto importante é melhorar a eficiência dos sistemas. Data centers em regiões mais frias, refrigeração inteligente com menor consumo hídrico e a otimização dos algoritmos podem reduzir significativamente o gasto de energia.
A transição para fontes renováveis também precisa ser feita com atenção aos impactos locais. Embora o Brasil tenha um grande potencial em energia solar e eólica, é preciso garantir que essas soluções respeitem as comunidades e o meio ambiente, para evitar a repetição de problemas associados a grandes obras de infraestrutura. Essa preocupação foi apontada pelo portal Software Mata Nativa (2024).
Por fim, especialistas e organizações da sociedade civil defendem mais regulação e transparência. Segundo o portal EcoDebate (2024) e o Desinformante (2024), exigir relatórios de consumo de energia e água, definir metas de compensação de carbono e condicionar incentivos fiscais ao cumprimento de práticas socioambientais são caminhos viáveis para equilibrar desenvolvimento e preservação.
Um futuro tecnológico que respeite o planeta
A inteligência artificial oferece oportunidades para inovação, economia e melhoria de serviços, mas seu avanço não pode acontecer às custas do meio ambiente.
Nesse sentido, o Brasil possui as condições estratégicas para liderar uma IA mais verde: uma matriz energética majoritariamente renovável, políticas públicas emergentes e iniciativas privadas inovadoras.
O desafio é transformar esse potencial em prática, com políticas sólidas, regulação efetiva e compromisso real com a sustentabilidade.
A tecnologia do futuro precisa ser inteligente também do ponto de vista ambiental, ou não haverá futuro para usufruí-la.
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